Os cartões de desconto e cartões pré-pagos na área da saúde

agenciaweber

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O tema de hoje foi sugerido por uma leitora do Blog do Corretor, que mandou a seguinte mensagem ao nosso querido editor:

De: xxxxxxxxxxxx

Enviada: 2016/11/09 09:31:41

Para: xxxxxxxxxxxxxxxx

Assunto: Pode ser conferido aqui

Bom dia! Tudo bem?

Achei esse assunto muito bom como sugestão (aos advogados) para discutir os impedimentos legais dos serviços médicos com descontos e cartões de descontos, (se é que existem impedimentos). bjos!

Segue o texto que pode ser lido no link enviado na mensagem:

O Ministério Público da Bahia (MP-BA) ajuizou uma ação civil pública contra a Desconto Card, por atuar em desacordo com as normas do Código de Defesa do Consumidor, da Lei dos Planos de Saúde e das resoluções da Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS). A ação, assinada pela promotora de Justiça Joseane Suzart, pede a suspensão das atividades da Desconto Card na área da saúde. Segundo a petição, a empresa opera sistemas de descontos e de garantia de preços diferenciados em diversos serviços de saúde em desacordo com as normas do Código de Defesa do Consumidor, da Lei dos Planos de Saúde e da ANS. Caso a ação seja acatada pelo Judiciário, a empresa terá que suspender a comercialização desses serviços. O MP-BA pede ainda que a empresa seja obrigada a indenizar os consumidores lesados pelos danos morais e materiais sofridos, bem como a coletividade em razão dos danos difusos. Um inquérito realizado pela Promotoria constatou que a Desconto Card realiza, sem autorização, a comercialização de sistema de desconto e de garantia de preços diferenciados em cartões. O inquérito revelou ainda que a empresa teria publicado propaganda enganosa em pelo menos duas rádios, informando acerca do fornecimento de serviços dentários “gratuitos”. A título de exemplo, um dos consumidores lesados teria pago a importância de R$ 200,00 para aderir ao serviço e, após buscar atendimento dentário, teve seu tratamento orçado em mais de R$ 3 mil, apesar da informação de que “havia descontos promocionais”. Segundo a promotora de Justiça Joseane Suzart, o MP chegou a marcar, em junho deste ano, duas audiências na 5ª Promotoria do Consumidor, mas a Desconto Card não compareceu a nenhuma.

Antes de mais nada, não tivemos acesso ao inquérito do MP-BA, de modo a não sabermos todos os detalhes e motivações do caso, mas podemos, pela leitura do relato, obter informações sobre pelo menos duas coisas totalmente diversas:

1) a existência de oferta de “descontos e de garantia de preços diferenciados em diversos serviços de saúde em desacordo com as normas do Código de Defesa do Consumidor, da Lei dos Planos de Saúde e da ANS” e;

2) a prática de propaganda enganosa.

Sobre o segundo tema, propaganda enganosa é crime previsto nos arts. 66 e 67, do Código de Defesa e Proteção do Consumidor, ocorrendo quando o vendedor fizer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços.

O mesmo se dá se o vendedor promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva.

Sobre esse tema, não paira qualquer dúvida, senão se a empresa efetivamente realizou ou não propaganda enganosa. Tema muito mais espinhoso é o primeiro, no sentido de se saber se é possível ou não a oferta de serviços de saúde através de cartões de desconto e cartões pré-pagos.

Esses cartões já não são propriamente uma novidade, sendo utilizados não só no Brasil, mas no mundo todo de forma popular. O grande diferencial do momento é a sua utilização para serviços de saúde, especialmente regulados pelo Estado Brasileiro.

A esse respeito, existem duas forças diametralmente opostas em conflito: de um lado, há um alegado interesse do governo em ampliar a oferta de serviços de saúde privados, sendo que existe a ideia de se criar “planos de saúde populares”, que serão o objeto do próximo artigo.

Do outro lado está o já mencionado interesse do Estado de tudo, absolutamente tudo regular, o que impede não só a criação desses planos de saúde populares, mas a própria existência de outras ofertas de serviços e o ingresso de novos players no mercado.

Sobre isso, a própria ANS divulgou um material (que pode ser encontrado aqui ) esclarecendo o que são os “cartões de desconto” e o que são os “cartões pré-pagos”.

O material é bastante claro no sentido de que esses cartões podem, sim, ser utilizados para oferta de serviços médicos. Porém, mais clara ainda é a advertência de que esses cartões NÃO são planos de saúde, não sendo regulados e fiscalizados pela ANS, além de que os planos e operadoras NÃO podem se associar ou oferecer serviços através desses cartões. Estimula-se o usuário a denunciar a operadora/plano que assim agir.

Assim, em resumo, o panorama simplificado que a própria ANS nos dá é a de que:

1) sim, é possível a oferta de serviços médicos e de saúde através desses cartões;

2) não, os planos e operadoras não podem atuar com serviços vinculados a esses cartões.

Essa é a opinião da ANS, mas, no Brasil, somente a morte é certa. Todo o resto é incerto.

Tudo por aqui é regulado ou, quando não o é, dá-se um aspecto de ilegalidade ou irregularidade. E mesmo com a regulação não há garantia de segurança jurídica. O Brasil não é para amadores.

Quando o MP-BA diz que houve desrespeito ao “Código de Defesa do Consumidor, da Lei dos Planos de Saúde e da ANS“, provavelmente poderá estar discutindo até as concessões que a ANS tem feito a esses serviços.

Não se nega, existe quase que uma esquizofrenia em nome da suposta “defesa do consumidor” e seus interesses.

A título de exemplo, você sabia que, a rigor, é proibido conceder descontos para pagamento à vista? Várias vezes o PROCON e outras entidades de defesa do consumidor já processaram empresas que concedem valor mais baixo para quem paga à vista ou para quem paga em dinheiro ou coisa semelhante. E, por incrível que pareça, venceram.

A existência dessa regulação excessiva desestimula a inovação e o consumo, pois ainda que quem esteja pagando esteja satisfeito e quem esteja prestando o serviço esteja fazendo-o bem, ainda assim pode ser que o Poder Público venha e interrompa a atividade.

Muitas pessoas, principalmente em razão da crise, já estão optando por esses cartões, por serem muito mais baratos e, aparentemente, lhes atender satisfatoriamente, muito embora os serviços sejam muito menos completos do que se teria através de um plano de saúde, e a depender do plano.

O limbo jurídico entre legalidade e ilegalidade dessas atividades cria um sistema de 8 ou 80: ou você tem dinheiro para um plano de saúde ou você é obrigado a ser cuidado pelo SUS. Não há um meio termo e, quando ele existe, possui um altíssimo risco jurídico, tanto para quem presta, quanto para quem paga. Privilegia-se o rico, pune-se o pobre e impede a grande maioria da população de ter acesso a serviços um pouco melhores do que os gratuitos.

Assim, lamento não ter uma resposta definitiva para a nossa leitora, pois no Brasil existe muita coisa que “não se pode fazer”, sabe-se lá por quais motivos, sempre de ordem burocrática.

Lamento mais ainda provavelmente ter lhe trazido um pouco mais de dúvidas, embora tenha esclarecido o que o célebre jurista Ives Gandra Martins quis dizer quando nos brindou com uma das maiores verdades: “o capitalismo no Brasil é um milagre”.

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Emmanuel Ramos de Castro
Amante da literatura, poesia, arte, música, filosofia, política, mitologia, filologia, astronomia e espiritualidade.

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