Por Bruno Barchi Muniz | LBM Advogados Associados
Nesse mês de agosto de 2023 lembramos os 10 anos de vigência da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), que trouxe grandes novidades no plano normativo pátrio. É uma lei que trouxe o Brasil para uma modernização necessária, ante a franca inexistência de regramento anticorrupção, já bem estabelecido sobretudo na Europa e Estados Unidos da América.
A pretensão, sem dúvida, foi também tentar tornar o Brasil em um grande “player” nesse tema, com uma legislação que era até mesmo mais rígida do que aquelas. Como exemplo, podemos dizer que a existência de um programa de compliance na empresa poderia atenuar a penalidade, ao invés de isentar a empresa de pena, como acontece em leis estrangeiras.
As multas, por sua vez, preveem base de cálculo sobre o “faturamento bruto”, tornando até mesmo descompassadas com a realidade do baixíssimo percentual de lucro de certos tipos de atividades.
Tive a oportunidade de ler no site CONJUR[1] o interessante artigo escrito por Jorge Hage, advogado e ex-ministro da Controladoria Geral da União, e um trecho já no final da exposição me chamou a atenção pela perfeita nomenclatura, quando ele comentava sobre a “aplicação desfocada e vulgarizante da Lei Anticorrupção”.
Isso derivaria, no entender dele – coisa com a qual concordamos – de a todo tempo se chamar de “corrupção” coisas que não passariam de meras irregularidades, e de “improbidade” qualquer coisa que, ainda que ilegal, fosse pouco relevante.
Os exageros são de todos os lados. Nos últimos 10 anos não há dúvidas de que foram desvelados os casos mais exorbitantes de corrupção jamais vistos no país. Só que, ao mesmo tempo, as instâncias jurídicas, inclusive o Ministério Público, realizaram tantos atos de abuso de direito que motivaram, com muita razão, o advento de Lei de Abuso de Autoridade atualizada.
No final das contas, o cidadão comum se sente em um país com mais ou menos corrupção do que antes havia? Como terminaram os procedimentos de investigação?
A “aplicação desfocada e vulgarizante da Lei Anticorrupção” denunciada no artigo que mencionei, na verdade, me parece que vai além: as próprias empresas negligenciam seus programas de integridade e, infelizmente, em grande parte dos casos o compliance se torna uma espécie de “perfumaria”, algo “para inglês ver”, quase como uma demonstração de “bom mocismo”.
Basta notar que todas as grandes empresas envolvidas nos escândalos de corrupção supostamente tinham compliance, enquanto que esses casos de corrupção não foram meros desvios internos, mas estiveram incorporados de forma sistemática na atividade dessas empresas.
A Lei Anticorrupção foi e é um grande marco em relação aos parâmetros para programas de compliance e mereciam melhor atenção. No entanto, a “vulgarização” acaba por torná-la francamente inefetiva, pois ninguém a considera com as delimitações que lhe cabem.
Uns querem somente usá-la para bem vestir e aparentar seus negócios, enquanto que outros querem estritamente ver essa vestimenta, sem, porém, avançar ao âmago dos programas de integridade.
Terceiros ainda querem usá-la para qualquer bobagem, coisa que também não cabe, transformando uma lei séria em uma espécie de “velhinha moralista”.
Em todos esses casos temos um uso caricato e desprestigioso da lei, que, vulgarizada, tende a se tornar cada vez menos lei e cada vez mais outras coisas, de vestimentas a porretes.
Bruno Barchi Muniz – é advogado, graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Santos, Pós-Graduado em Direito Tributário e Processual Tributário pela Escola Paulista de Direito (EPD), membro da Associação dos Advogados de São Paulo. É sócio-fundador do escritório Losinskas, Barchi Muniz Advogados Associados.