O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), que abrange os Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, decidiu recentemente sobre tema polêmico: a quem cabe decidir sobre a realização de certos tratamentos médicos?
No caso específico, tratava-se especificamente sobre questões de parto, tema ainda mais sensível diante de movimentações de organizações populares (ou não) que lutam pelo chamado "parto humanizado", que toma nuances diferentes a depender da organização que o defende.
Enfim, foi posta em discussão a legalidade de uma portaria já antiga do Ministério da Saúde, que determinava a diminuição progressiva do número de cesarianas, devendo ela ser preterida em benefício do parto normal.
O Ministério da Saúde justificou a necessidade dessa portaria em razão de elevadas taxas de mortalidade materna e perinatal, havendo suposta relação com os altos percentuais de cesáreas praticadas no Brasil.
Ao mesmo tempo, implantou-se o Programa de Digitação de Autorizações de Internação Hospitalar, cujo objetivo é, por meio de certo tipo de controle, limitar o pagamento de cesáreas pelo SUS, até o limite do percentual máximo estabelecido em portaria, forçando, pela via econômica, a obediência da norma por parte dos hospitais públicos e filantrópicos.
Na decisão, entendeu-se que a legislação contempla a competência governamental, inclusive através do Ministério da Saúde, para regulamentar ações e serviços de saúde, sendo que a atuação complementar da iniciativa privada na saúde, constitucionalmente prevista, deve também se submeter a esses regramentos, quando prestada mediante contrato ou convênio com o SUS.
Com isso, legítima a observância, por parte desses estabelecimentos de saúde, das normas técnicas e administrativas, aos princípios do SUS e ao equilíbrio econômico e financeiro do contrato firmado com o próprio SUS.
Logo, inexiste qualquer ilegalidade, para o TRF3.
Porém, na própria decisão ressaltou-se que havendo necessidade de se realizar um percentual maior de cesáreas do que o estabelecido pela norma, deve o SUS arcar normalmente com esse custo, pagando os hospitais vinculados no exato limite do efetivamente realizado, e não do percentual que a norma estabelece.
Justificou-se, na decisão, que a necessidade ou não do procedimento deve ser verificada sob exclusivo critério do médico, repita-se: exclusivo critério do médico, observado também risco de vida.
Partindo do pressuposto de que todo e qualquer procedimento realizado por médico, até prova em contrário, vem em favor da saúde e da vida do paciente, teremos que, afinal, a decisão sobre a realização ou não da cesárea está inteiramente nas mãos do médico, não podendo o SUS ou qualquer outro órgão, por mais qualificado que seja, substituir a opinião do profissional habilitado.
Com isso, conclui-se que em qualquer seara a palavra final sobre o tratamento deveria ser do profissional da medicina, palavra que se sobrepõe aos regulamentos genéricos emitidos pelo Estado, que, ainda, não poderá se furtar a remunerar o procedimento escolhido pelo médico.
Em tempo, recentemente a ANS divulgou resolução que dispensaria aos planos de saúde a obrigação de pagar cesáreas eletivas. A norma não teve vida longa e foi alterada para permitir à paciente que faça a cesárea eletiva, se assim desejar. Para tanto, deverá assinar um termo de consentimento informando ali a sua vontade.
Acredita-se que, dessa forma, a paciente sairá ganhando, ampliando-se seu direito de escolher. Ao médico caberá expor a cada paciente as vantagens e desvantagens de cada procedimento (cesárea e parto normal), outorgando-se à ela o direito de escolha, desde que isso não impacte na saúde e vida da mãe e do filho.