A instituição do compliance numa linha tênue entre cooperação e ingerência

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O compliance, que etimologicamente significa ?estar em conformidade?, é entendido como um sistema de normas e procedimentos para prevenção, detecção e remediação de atos classificados como inadequados por aquele que o instituiu.
 
É também um dos temas que vem ganhando cada vez mais destaque no mundo empresarial, e isso, sem sombra de dúvida, decorre dos impactos da globalização. Dentre estes impactos, dois deles são cruciais para a disseminação da necessidade do compliance.
 
A concentração do poder econômico é um deles, pois na medida em que há uma maior integração entre empresas nacionais e estrangeiras, a padronização de condutas de todos aqueles que integram este grupo econômico se mostra fundamental.
 
Isso porque a legislação oriunda dos países de origem destas empresas estrangeiras determina a responsabilidade pelos contratos que firma e, consequentemente, os efeitos que estes contratos importam.
 
É o que vem ocorrendo, por exemplo, na aplicação da Lei Anticorrupção dos EUA, conhecida como FCPA, sujeitando as empresas norte-americanas envolvidas com o caso da Lava-Jato às sanções previstas no seu sistema jurídico.
 
Como segundo impacto da globalização, temos um aumento significativo do papel dos organismos multilaterais na produção de regras jurídicas e a soberania nacional perdendo cada vez mais sua importância.
 
Ressalto que o intuito deste artigo está longe de pretender avaliar se tal impacto é positivo ou negativo, mas é fato que por pressão internacional da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), do qual o Brasil faz parte e se comprometeu no combate à corrupção nacional ou estrangeira, é que incorporamos recentemente em nosso sistema jurídico a Lei Anticorrupção.
 
A importância do compliance fica evidenciada no momento em que tal mecanismo, tanto pela legislação internacional quanto pela lei brasileira, pode ser considerado como circunstância atenuante para a aplicação de eventual pena.
 
Os benefícios de sua adoção, no entanto, vão muito além desta finalidade, remonta todo um conjunto de normas e procedimentos capazes de enlevar de maneira sensível as formas de controle e boa governança corporativa.
 
É neste último aspecto que pairam as mais diversas dúvidas sobre o papel do compliance, e neste artigo, abordaremos a questão sob o ponto de vista do mercado de comercialização de planos de saúde.
 
Algumas das principais operadoras do mercado já contam com um programa de conformidade próprio, e como já ressaltado, isso se dá por razões do impacto de um mercado globalizado cuja padronização de boas condutas (best practices) é de interesse tanto de seus investidores quanto dos países em que a atividade econômica será desenvolvida. 
 
Essas operadoras, no entanto, têm repassado para as corretoras vinculadas a exigência de também observar suas regras de compliance, sob a condição delicada de manter a continuidade na relação contratual entre quem cria o produto de comercialização e aquele que de fato o comercializa.
 
A título de ilustração, algumas operadoras passaram a exigir, por meio de cláusula contratual, a submissão das corretoras a procedimentos de auditoria externa sob o seu comando, importando na obrigação de enviar qualquer documentação que seja requisitada. Com efeito, é inegável a existência de um determinado grau de sujeição das corretoras às operadoras de planos de saúde, numa relação em que aquelas dependem do produto destas para poder sobreviver no mercado.
 
É de se ressaltar, porém, que esse controle não pode, em hipótese alguma, afetar a autonomia das corretoras, isto é, não pode haver configuração de ingerência, sendo perfeitamente aceitável que as operadoras possam estabelecer, por conta própria, políticas regulatórias contratuais com as corretoras, a fim de se resguardar de eventual responsabilização.
 
As corretoras, contudo, também possuem total autonomia para desenvolver o seu próprio programa de compliance, e da mesma maneira poderá estabelecer regras para aprimorar o controle de sua atividade e daqueles com quem está realizando negócios.
 
Assim, a relação entre as corretoras e as operadoras deve ser harmoniosa e cooperativa, de modo que se evitem ingerências de umas sobre as outras, mas possibilitando que desenvolvam políticas que articulem e beneficie toda a atividade econômica foco da relação.

 

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Emmanuel Ramos de Castro
Amante da literatura, poesia, arte, música, filosofia, política, mitologia, filologia, astronomia e espiritualidade.

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