No artigo anterior, esclarecemos mais um pouco sobre nosso pensamento a respeito da obrigação de profissionais da área médica em relação à obtenção ou não do resultado desejado.
Principalmente no que foi postado no site Jusbrasil, muitos colegas fizeram comentários extremamente relevantes, que muito contribuíram para pensarmos cada vez melhor o tema, embora sem a pretensão de encerrá-lo definitivamente.
Na ocasião, falamos que mesmo considerando a cirurgia estética uma obrigação de resultado, ainda assim existiriam fatores que estariam além dessa suposição, tendo em vista certa imprevisibilidade médica sobre alguns aspectos, como a forma de cicatrização de certos cortes.
Mas, para além disso, o colega Rafael Guimarães fez um pertinente comentário, que nos abre um novo campo de discussão:
"O problema maior nisso é que uma parcela da clientela dos cirurgiões plásticos sofre de transtornos psicológicos, que leva tais pessoas a jamais se sentirem satisfeitas com o resultado obtido, não importando o quão perfeitamente estético tenha sido este. Há um distúrbio chamado "dismorfia corporal" (também conhecido como Transtorno Dismórfico Corporal ou Síndrome da Distorção da Imagem) e no qual a pessoa nunca se satisfaz com a própria aparência. Estas pessoas, se tiverem recursos financeiros para tanto, são clientes contumazes de cirurgiões plásticos, permanentemente insatisfeitas com a própria imagem. Hoje muitos cirurgiões rejeitam clientes que lhes relatam que já passaram por outras cirurgias, um fidedigno indício de que tais pessoas os levarão futuramente a tribunais, mais uma vez insatisfeitas com o resultado da cirurgia."
De fato, isso existe e representa um risco jurídico real aos profissionais da área médica, embora se resuma, talvez, mais em um problema de saúde do que de justiça.
Curiosamente, poucos dias depois, tive acesso a uma decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que negou indenização a uma paciente insatisfeita com a cirurgia plástica a que havia se submetido.
Ela havia relatado, no processo, que realizou rinoplastia e que isso lhe gerou prejuízo à respiração, fazendo com que tivesse que se submeter a uma nova cirurgia, dessa vez para corrigir o desvio de septo nasal que a rinoplastia teria causado.
Em perícia judicial, não se constatou sequer a dificuldade de respiração, menos ainda a relação que teria com a rinoplastia.
A ação foi julgada improcedente, mas o que mais chama a atenção foi parte a fundamentação do relator, nos seguintes termos: "Não se nega que a cirurgia estética é uma obrigação de resultado, mas não ficou demonstrado que o resultado prometido não foi alcançado. Não há nos autos nenhuma prova de que a apelante tenha sofrido algum dano com o procedimento cirúrgico realizado".
O que chama a atenção aqui é que imputou-se à paciente que reclamava o dever de comprovar que o resultado prometido não foi alcançado, algo que, nas obrigações de resultado, costuma ser imputado ao prestador do serviço.
Concordamos com o posicionamento do desembargador, pois, além da subjetividade inerente ao caso e as questões de problemas psicológicos relacionados à própria aparência, algo mais comum do que se imagina, atribuir a responsabilidade de prova ao profissional da medicina seria colocar-lhe a espada sobre a cabeça e entregar ao paciente uma condição de poder absoluto, segundo o qual a simples alegação de insatisfação geraria automaticamente responsabilidade de indenizar.
Não se ignora que muitos profissionais da área já estejam adotando de longo tempo práticas preventivas, como a realização de desenhos e outras formas de pré visualização do resultado, mas o formato da decisão mencionada acima parece ser muito adequado para a solução deste tipo específico de caso de obrigação de resultado, embora, no nosso entender, talvez não deva ser o modelo a se utilizar para outros setores que também atuam com obrigação de resultado.