Allianz e seus planos para o Brasil

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Momento é de esperar para ver, diz CEO da Allianz

Por Flávia Furlan | De São Paulo

O grupo alemão Allianz, que fatura perto de EUR 130 bilhões ao ano, acaba de fazer uma grande aposta no mercado brasileiro. Dono de uma das maiores seguradoras do mundo, assinou um cheque de R$ 3 bilhões para a compra da carteira de automóveis e ramos elementares da SulAmérica. Planeja ainda lançar planos de previdência, se a reforma da Previdência sair do papel.

"A nova compra é uma oportunidade de ganhar tamanho, acessar talentos e corretores. E, obviamente, ter ganhos de escala", disse o alemão Oliver Bäte, presidente do grupo desde 2014, que falou ao Valor em passagem por São Paulo. No país, considerando o critério IFRS, a seguradora saiu de um prejuízo operacional de R$ 561 milhões em 2014 para um luccro de R$ 104 milhões em 2018.

Já na posição de investidor institucional, com a credencial de quem administra aproximadamente EUR 2,2 trilhões em investimentos, considerando a gestora Pimco, da qual o grupo é dono, o Brasil perde relevância. Bäte afirma que o momento ainda é de "esperar para ver" as reformas na prática para investir no país. Do portfólio total, só EUR 100 milhões estão aplicados no Brasil, nos segmentos de energia, distribuição de gás e data center.

"Melhorar a infraestrutura e a educação será importante para o país continuar sendo bem-sucedido como uma democracia. Vocês precisam construir algo como o 'Brazilian Dream'", disse.

Valor: Qual a estratégia da Allianz no Brasil, após a compra da carteira da SulAmérica?

Oliver Bäte: Quando me tornei presidente, tínhamos uma situação difícil no Brasil. E trabalhamos muito duro para mudar isso. No último ano, dissemos: agora que estamos fora de perigo, precisamos de maior participação, porque, quando não se está no topo, há desafios – com os intermediários, que nunca dão a mesma parcela de atenção; e com os talentos, particularmente no Brasil, que preferem empresas em posição de liderança. É diferente no Peru ou na Colômbia, onde os talentos locais preferem trabalhar em multinacionais. Para nós, a nova compra é uma oportunidade de ganhar tamanho, acessar talentos e corretores. E, obviamente, ter ganhos de escala. A SulAmérica criará uma empresa, que será combinada à nossa operação, processo que deve durar de seis a nove meses.

Valor: Qual o objetivo com a carteira de automóveis?

Bäte: O seguro de carro no Brasil é basicamente o 'casco' [cobre roubo, furto ou dano]. Por definição, o cliente desse produto tem mais dinheiro, porque quer proteger seu próprio bem, mas não queremos atingir apenas as pessoas ricas. O Brasil é um dos poucos países que não têm responsabilidade a terceiros obrigatória em seguro de carro, e aí está uma oportunidade. Estamos atentos a caminhões e frotas, área que precisamos investir porque é parte importante da economia. Sempre nos dizem que o seguro de carro está morrendo, porque o carro não será propriedade privada. Por um bom tempo, isso não será verdade, porque o custo médio do reparo está crescendo – e fortemente – devido às peças de carros elétricos.

Valor: A Allianz vai oferecer os produtos "pay as you use", de pagamento conforme o uso?

Bäte: Temos essas tecnologias, mas veremos a preferência do consumidor. E não significa que esse produto seja melhor. Nos primeiros três anos de licença para dirigir, a propensão para ter um acidente é 15 vezes maior do que aos 30 anos. Mas a sociedade decidiu não tarifar o jovem no preço real porque ele não teria como pagar por nenhum seguro. Há um nível de subsídio cruzado nesse sistema e, portanto, o que a sociedade quer é a questão. Acredito na telemetria, mas por um motivo diferente: melhorar a forma de dirigir e controlar o risco. O poder da telemetria não é diferenciar o risco bom do ruim, é dar feedback de como o motorista dirige e, a partir daí, melhorar os riscos de forma geral.

Valor: Como a tecnologia está transformando o setor?

Bäte: Podemos ter tecnologia hoje para boas soluções de baixo custo. E isso é muito importante porque nossa indústria, historicamente, não foi eficiente. O produto tem um desenho muito complicado, há muitos papéis para assinar, muitas vezes exigido pelos reguladores. Essas coisas precisam ser simplificadas.

Valor: No Brasil, a eficiência já se traduziu em lucratividade?

Bäte: Estamos chegando perto do que precisamos em termos de lucratividade. Ano passado foi muito difícil, mais por um erro nosso do que do mercado. Tivemos de reestruturar o negócio de um modelo ineficiente para outro mais moderno. Tivemos no início alguns erros de implementação, mas agora está funcionando. Não ensinamos nosso pessoal como usar o sistema de maneira apropriada, não investimos o suficiente em customização dos produtos para o mercado local, sem perder a eficiência.

Valor: Com a queda do juro básico, como os resultados financeiros impactaram a empresa no país?

Bäte: Assim como a indústria, a Allianz está ficando mais eficiente – não esqueça que estamos na Alemanha, então, sabemos lidar com receitas financeiras menores. Mas precisamos contar menos com essas receitas e mais com performance operacional. No Brasil, estamos conseguindo isso com a revisão do portfólio e mudanças do sistema.

Valor: Como o juro negativo impacta a empresa no papel de investidora institucional?

Bäte: Somos um dos maiores investidores institucionais do mundo, com EUR 729 bilhões em nome dos clientes de seguros e EUR 1,5 trilhão em gestão de ativos da Pimco e da Allianz Global Investors. Está ficando cada vez mais difícil investir, porque temos parte significativa do mercado de títulos públicos com taxas negativas, mas também uma supressão exagerada de spreads de crédito. O risco não está sendo pago no mercado, o que é muito perigoso. Há uma inapropriada precificação de risco. Significa que, nos países em que podemos comprar título público, porque tem taxa positiva, o risco está tão alto, relativamente ao retorno, que fica difícil investir. Essa é uma consequência dos bancos centrais inundando o mercado com liquidez barata. E, de forma geral, o mundo está piorando. A geopolítica global está ficando mais complicada, com conflito de EUA e China, Brexit, crash da Argentina.

Valor: O mundo deve passar por uma recessão?

Bäte: Tenho muito respeito ao [presidente do BCE, Mario] Draghi, ao que fez em 2012, resgatando o euro dos especuladores, mas a política de juros está errada. Ela permitiu empréstimos baratos para aqueles que não conseguiam, particularmente governos, e camuflou o problema, pois não forçou as pessoas a poupar quando deveriam, prometendo aposentadorias que não poderiam fornecer. A segunda coisa é que não ajudou a elevar investimentos. As pessoas investem quando há bons projetos, não porque o dinheiro está barato. Não tivemos investimento suficiente na nossa infraestrutura e no futuro. A questão hoje é que vamos caminhar para recessão.

Valor: E o Brasil neste contexto?

Bäte: O Brasil teve seus próprios ajustes. Sou positivo sobre o país no longo prazo. Há recursos naturais, população grande, boas universidades, um grupo internacional de pessoas, os imigrantes. A questão é como criar acesso às oportunidades para uma grande parcela da população? Melhorar a infraestrutura e a educação vai ser importante para o país continuar sendo bem-sucedido como uma democracia. Porque vocês precisam de alguma estabilidade. As pessoas sempre falam de redistribuição: se quer redistribuir algo, tem de criá-lo. Eu fui a uma universidade nos EUA e, àquela época, o sonho não era fácil, mas se trabalhasse e estudasse duramente, havia oportunidade para mudar o destino. Era o chamado American Dream. Vocês precisam construir algo como o 'Brazilian Dream'.

Valor: Qual a sua avaliação do cenário político no país?

Bäte: Não sou um especialista em política brasileira. Gosto da agenda de reformas, como a da Previdência e a tributária, mas também temos de ver a implementação. Então, estamos numa posição de 'esperar para ver' o quanto haverá de execução. Na Alemanha, há uma frase que diz 'não há nada melhor do que as coisas que você realmente faz'. Se a reforma da Previdência for aprovada, vamos também trazer ao país os planos de previdência privada.

Valor: Como vocês pretendem atuar em previdência no país?

Bäte: Tínhamos há um tempo, mas os produtos que vocês têm são muito tradicionais, exigem muitas garantias e capital. A maioria dos produtos vendidos aqui são basicamente feitos por bancos. O tipo de produto que vai ser requerido, após a reforma, é mais em linha com o que gostamos de fazer, por outras fontes de distribuição e mais portabilidade.

Valor: A Allianz é seguradora da Vale. Como foi afetada pelo acidente de Brumadinho?

Bäte: Não estávamos expostos à barragem nem à cobertura de meio ambiente. Mas éramos, infelizmente, parte de um grande consórcio que cobria seguros gerais. Mudamos nossa governança. Continuamos avaliando propostas de projetos individuais, mas também as grandes empresas de mineração para entender como estamos alocando responsabilidades.

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Emmanuel Ramos de Castro
Amante da literatura, poesia, arte, música, filosofia, política, mitologia, filologia, astronomia e espiritualidade.

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