Cerca de 4 meses atrás, boa parte do país – à exceção, em regra, dos que se intitulam falsamente de "defensores dos trabalhadores" – comemorou a chamada "reforma trabalhista", forma que se adotou chamar tímidas mudanças que, embora benéficas, não alteram de forma substancial as relações de trabalho que hoje temos.
Ela outorgou, no máximo, um pouco mais de liberdade entre as partes antes muito mais engessadas, buscando, talvez, trazer um pouco mais de segurança jurídica.
Passados os ditos 4 meses, é iminente a entrada em vigor da nova legislação. Só que agora a situação de comemoração e preocupação se inverteu. Os "defensores dos trabalhadores" estão tranquilos, enquanto que os partícipes da relação de emprego, especialmente as empresas, estão preocupados. E com justiça.
Como noticiado pelo DCI-SP em 08/11/2017, muitas empresas temem aplicar reforma diante da possível resistência dos juízes do trabalho em manejar as novas normas legais.
Pensam, alguns, que talvez seja melhor aguardar a formação da jurisprudência para saber o que fazer. Ou seja, esperar que alguém mais corajoso se aventure na nova legislação antes de eles próprios saberem o que devem fazer. Com isso, certamente deixarão de aproveitar dos benefícios da reforma, mas talvez julguem ser melhor do que tomar riscos diante de uma jurisprudência totalmente incerta.
Incerta, em termos, pois a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), uma daquelas tantas organizações de funcionários públicos que vivem de atrapalhar a vida das pessoas, já declarou que a reforma é "inconstitucional" e que os juízes não irão aplicá-la.
Se a Anamatra realmente fala em nome de todo os magistrados, tenha dúvidas. Mas é uma declaração bastante preocupante.
O atual Presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Martins Filho, ao contrário, fez elogios à reforma e tende a aplicá-la. Mas nem todos os casos vão até o TST. A grande maioria termina nas jurisdições inferiores, onde certamente estão muitos adeptos da Anamatra.
Essa reforma trabalhista, embora não tenha absolutamente nada de inconstitucional, peca em algo que sempre frisamos: não é possível mudar a realidade, muito menos uma cultura, através de uma simples canetada.
Possuímos uma legislação trabalhista obscena já há 70 anos, uma legislação verdadeiramente fascista – em conteúdo, não em xingamento -, herança mal assombrada de Getúlio Vargas para as gerações posteriores. Um encosto que beneficia alguns pequenos grupos bastante poderosos, fazendo com que seja quase impossível uma reversão a curto ou médio prazo.
É verdade que a realidade recente ajudou e muito a tirar a venda dos olhos de algumas pessoas. Mas uma cultura não se muda de uma hora para a outra.
Temos que entender que a CLT impera há mais de meio século. A Constituição Federal, já chegando aos 30 anos, é uma consagradora de absurdos de toda sorte, garantindo fartos direitos na base da caneta. É o estandarte maior do "progressismo arcaico", como assim chamou Roberto Campos.
O mesmo Roberto Campos, que já morreu há mais de 15 anos, falava, muito antes, sobre como a Constituição trabalhista era particularmente ruim. Em certa oportunidade, fez uma declaração inesquecível:
“Aliás, a preocupação dos Constituintes não foi facilitar a criação de novos empregos, e sim garantir mais direitos para os já empregados.”
Por isso é que raramente se vê um desempregado ou um pobre elogiando a CLT, enquanto que funcionários públicos (que normalmente são regidos por seus estatutos próprios, e não pela CLT) e empregados de postos mais elevados são tão fiéis à CLT da forma como foi concebida.
Temos, portanto, uma legislação muito antiga, cara, ineficiente, carregada de ideologia. Depois, veio uma Constituição consagrando tudo isso que era caro, ineficiente e cheio de ideologia. Enquanto isso, ao longo de 70 anos os juízes vieram sendo doutrinados e acostumados a uma metodologia cara, ineficiente e cheia de ideologia.
Há, assim, uma cultura geral muito nebulosa, incapaz de ser dissipada por uma simples alteração legislativa. É necessário quase que um verdadeiro exorcismo para retirar o espírito que sobrevoa o Direito do Trabalho e a Justiça do Trabalho. E isso não se faz sem um esforço inverso ao que foi feito para trazer esse espírito, esforço este que leva décadas para começar a surtir maiores resultados.
A reforma trabalhista, ainda que tímida, é muito bem vinda. Não é, porém, apenas a vigência da norma que trará a solução para os problemas nacionais relacionados ao emprego. É necessário que se desmascare os grupos de pressão muito interessados na manutenção da péssima legislação trabalhista e, mais importante do que qualquer outra coisa, desfazer a lavagem cerebral imposta a muitos juízes.