Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que abrange o sul do país, decidiu que União, Estado e Município deverão custear a cirurgia cerebral de um paciente portador de Mal de Parkinson.
No caso, o paciente havia sido submetido em 2007 a uma cirurgia para implantar um estimulador cerebral, que não era apto a curar a doença, patamar ainda não alcançado pela ciência, mas que melhoraria a qualidade de vida do acometido.
Só que esse dispositivo, como é natural daqueles eletrônicos, funciona com energia, provida, no caso, por baterias. E a bateria acabou, exigindo nova cirurgia para que se realizasse a troca por uma peça totalmente recarregada. Só que foi negada essa segunda cirurgia, pois o SUS não cobre o procedimento de manutenção…
Como resultado, o paciente ingressou na Justiça e houve a determinação de bloqueio de dinheiro das contas das entidades públicas no valor da cirurgia, a fim de que fosse o montante destinado ao pagamento do procedimento em hospital particular.
Os entes públicos argumentaram que não poderia haver esse provimento, pois, no caso, o Judiciário estaria substituindo o Executivo a respeito da destinação dos recursos públicos. Na decisão de segunda instância, a relatora, Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler afirmou que “a separação dos poderes não significa que a Justiça seja proibida de intervir em matérias de efetivação de direitos fundamentais”.
Do ponto de vista jurídico, entendo que a decisão não é considerada “ativismo judicial”, por determinar a efetivação de um direito escancarado na Constituição Federal, tendo seu alcance limites bastante objetivos, e não de criação de políticas públicas. No entanto, a decisão talvez devesse se pautar na execução da forma menos onerosa para o Estado e, desconhecendo detalhes mais profundos do caso, não sei se foi essa a hipótese.
De qualquer modo, salta aos olhos de todos que o nosso sistema de saúde chega a ser até mesmo mórbido, por autorizar uma cirurgia para implantação de dispositivo, mas não autorizar outras cirurgias para a sua manutenção. É semelhante à venda de um produto sem assistência técnica. O legítimo tratamento da pessoa como coisa.
Sou crítico do SUS por inúmeros motivos e por todas as suas falhas. Não creio ser o melhor método e nem que a Constituição Federal prevê a forma mais adequada de se prover saúde ao povo. Mas acredito que mesmo o mais visionário dos constituintes provavelmente jamais imaginou a que ponto drástico e desumano o tratamento da saúde pública chegaria.
O direito à saúde, tão evidente na Constituição, se tornou definitivamente um direito a ser alcançado em processos judiciais.