Quando eu estava no segundo ano de faculdade, muitos anos atrás, meu excelente professor de Direito Civil falou para toda a classe: "responsabilidade civil você pode aprender em uma aula, como agora, ou em seis meses, como estudei em minha especialização".
Não fazia sentido, no primeiro momento, aquela afirmação, mas o desenrolar dos anos de estudo e a vivência profissional mostraram que aquele professor estava certo: é um assunto que pode ser tratado de forma relativamente simples, se formos pensar apenas na estrutura em si da responsabilização civil: "ação/omissão + culpa em sentido amplo + nexo causal a uni-las = responsabilidade civil". A variável da questão é a manutenção ou exclusão da culpa, se estivermos tratando da responsabilidade objetiva.
No entanto, se formos apreciar mais a fundo, faremos um estudo que mais se aproxima do regime de commom law, pela análise de casos, que torna o aprendizado quase interminável.
Para cada situação há uma imensidão de decisões em todos os sentidos, reconhecendo ou não a responsabilidade civil. Há também as formas de responsabilização, sempre em constante evolução; ou seja, os motivos que fazem a responsabilidade de a pessoa se vincular ao fato tido por danoso.
Um caso recente julgado pelo TJ/SC bem serve a qualquer professor para ilustrar situação que engloba diversos tipos de responsabilidade civil.
Nele, o Tribunal condenou um laboratório de análises clínicas a pagar indenização por danos morais a um senhor de 71 anos, em razão de a empresa ter perdido uma amostra de tecidos da garganta do homem, prejudicando o rápido diagnóstico e início do tratamento.
A perda exigiu que o senhor se submetesse a novo procedimento, naturalmente invasivo, que exigia internação e desgaste ao qual não precisaria se submeter não fosse a perda da amostra.
Na defesa, o laboratório argumentou que a perda foi ocasionada pela transportadora, sendo que ela deveria ter sido responsabilizada.
O julgamento não acolheu essa tese e, como já dito, confirmou a condenação.
Temos aqui hipótese de reconhecimento de dano moral, consistente em ter se exigido que o senhor passasse por procedimento médico desnecessário, caso a amostra não tivesse sido extraviada.
A angústia, sensação de revolta com procedimento tão atabalhoado, além do desgaste decorrente de nova internação, de fato, justificam a responsabilização nesse ponto.
A condenação também teve como viés a observância de que o diagnóstico demorado pode ter prejudicado o tratamento, que poderia ter sido iniciado mais cedo, talvez com resultado melhor.
Note-se que, aqui, tem-se quase um exercício de futurologia, a admissão das variadas hipóteses do que poderia vir a acontecer. Mas o que importa é que a pessoa acabou privada de rapidamente tomar decisão e começar a buscar tratamento. Trata-se, portanto, da "responsabilidade pela perda de uma chance", independentemente do resultado.
Na análise da defesa do laboratório se tem a imputação da responsabilidade a terceiro. No entanto, o julgamento entendeu que ainda que isso seja verdade, manter-se-ia o dever de indenizar da empresa condenada, pois foi ela quem elegeu o parceiro que realizaria o transporte. Trata-se, pois da "responsabilidade pela eleição ou in eligendo".
Por fim, se verdadeira essa parte, poderá caber ao laboratório a "responsabilidade por regresso" contra o real causador do dano, que responderá pelo prejuízo causado não ao senhor que precisava de diagnóstico, mas ao laboratório que acabou condenado.