Planos de saúde um pouco mais distantes da esquizofrenia tributária

agenciaweber

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Alguns meses atrás, publicamos um artigo intitulado "Planos de saúde no abismo da esquizofrenia tributária".

Relatamos, nele, que recente alteração na legislação nacional do ISSQN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) prejudicou muito principalmente o setor de planos de saúde e o de serviços bancários, ao alterar o local de recolhimento do tributo do local da sede do prestador – como sempre fora antes – para a sede do tomador do serviço.

Dissemos, na ocasião, que os planos de saúde poderiam vir a ter que recolher ISSQN para até 5.570 municípios diferentes, a observar 5.570 legislações diferentes, tudo para o mesmo ato. Isso, claro, partindo do princípio de que toda a legislação dos 5.570 municípios seja constitucional, boa, idônea e prática.

Na realidade, como lembrado naquele artigo, cerca de 60% das leis cuja constitucionalidade se questiona acabam sendo, ao final, declaradas inconstitucionais pelo STF. Isso geraria, para este caso, no mínimo, por amostragem, 3.342 normas a se questionar Brasil afora.

Vendo que a medida era debilitante, representantes dos setores prejudicados foram ao STF questionar a norma e obtiveram liminar prolatada pelo relator do caso, Ministro Alexandre de Moraes, desobrigando a esse recolhimento a ser realizado com método absurdo.

Os argumentos foram bastante razoáveis e tocaram um ponto bastante evidente, mas que nem foi objeto do nosso comentário anterior: em relação a esse tipo de atividade não há uma definição clara na lei sobre quem seja o "tomador do serviço", para fins de identificação do município credor do ISSQN.

Quando falamos da atividade da advocacia, por exemplo, é claro que quem toma o serviço é aquele que contrata o advogado; é aquele para quem o advogado realiza sua atividade. Não acaba sendo um problema real, pois o ISSQN dos serviços de advocacia se recolhe no município sede do prestador, evitando maiores dificuldades de interpretação.

Mas a atividade dos planos de saúde não é tão simples de se visualizar. Analisemos a situação mais comum atualmente de contratação de planos de saúde, que é a empresarial e coletiva: quem é o tomador do serviço, neste caso, a empresa ou cada funcionário que adere ao plano coletivo, enquanto indivíduo?

Se for cada funcionário, individualmente, qual será o local da tomada do serviço: o município da sede da empresa, onde o contrato é firmado; o município onde o funcionário tem residência ou; o município onde lhe for prestado um serviço de saúde, como uma consulta ou um procedimento interventivo?

E se esse funcionário for divorciado e, no plano de saúde, tiver como dependente um filho menor que mora com a mãe em outra cidade, quem está tomando o serviço? O próprio funcionário? O filho menor? A mãe, representante legal do menor?

E se um funcionário da empresa que trabalha viajando, vendendo e visitando fornecedores se acidentar no meio da estrada e precisar de atendimento médico, qual município será o credor do ISSQN referente? Aquele onde houve o acidente? Aquele onde ocorreu o atendimento? E se houve uma ambulância do plano de saúde para fazer o atendimento de emergência e levá-lo para hospital de outro município, como fica a questão?

Para quem mora em grandes cidades algumas hipóteses podem parecer dúvida sem fundamento, pois, em boa parte dos casos a pessoa mora no mesmo município onde trabalha e onde mantém seus médicos.

Mas, quem é natural de cidade pequena, como eu, deve logo ter pensado naquela empresa da cidade vizinha, que emprega 5.000 pessoas de todas as cidades da região, que precisam viajar 10, 20 ou 30 km para chegar no seu município de trabalho, sendo que, quando precisam de atenção médica mais especializada, precisam ir ainda para um terceiro município, que é a referência regional de atendimento para determinados casos.

Há mesmo no horizonte todos os ingredientes para uma guerra fiscal sem precedentes entre os municípios, que podem editar leis contraditórias entre si e obrigar os planos de saúde a recolherem ISSQN em mais de um município por um mesmo serviço prestado.

Da mesma forma, a se depender da interpretação, um mesmo contrato coletivo pode gerar recolhimentos individuais para diversos municípios. E qual será o critério de repartição? Nada disso há na lei.

Tecnicamente, no meu entender, sob este ponto de vista, não se pode dizer sequer existente a lei que institui o tributo, pois ausente a definição minimamente clara sobre quem é o polo ativo da relação tributária, ou seja, não há esclarecimento sobre quem é o credor da obrigação tributária. Dizer, como diz a lei, que é "o município" ou "os municípios" não é o suficiente para definição concreta destes casos específicos.

Certeza mesmo, além da guerra entre os municípios, é que a única vítima será o contribuinte. Não só pelo custo tributário em si, mas pelo aumento do custo do serviço, motivado pelo fator tributário, já que as obrigações acessórias (obrigações de declarar, emitir guias, recolher valores etc.) passaram repentinamente daquelas emanadas por 1 ente para aquelas emanadas para 5.570 entes.

Essa alteração na lei foi um terrível erro legislativo, não só pela medida intrinsecamente ruim, mas pela redação repleta de lacunas, sem nenhuma definição específica para estes setores de atividades bastante específicas.

Foi uma medida oriunda do Executivo e Legislativo Federais em espécie de "populismo intra político", pois feito para agraciar os prefeitos municipais, ansiosos por repartir uma arrecadação que julgavam muito concentrada. E agora estamos neste cenário completamente louco.

Quer dizer, a liminar prolatada pelo Ministro Alexandre de Moraes paralisou, ao menos por enquanto, essa medida. Mas, por quanto tempo?

A esquizofrenia tributária para o setor ainda é iminente.

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Emmanuel Ramos de Castro
Amante da literatura, poesia, arte, música, filosofia, política, mitologia, filologia, astronomia e espiritualidade.

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