A enfermidade do sistema de saúde no Brasil

agenciaweber

agenciaweber

Plano de saúde busca saídas após debandada de 1,4 mi de usuários


por Cláudia Collucci | Uol

.Com 1,4 milhão de usuários de planos de saúde a menos em um ano e vivendo nesse período uma inflação da saúde recorde –o dobro da inflação geral medida pelo IPCA–, a saúde suplementar discute medidas para garantir a sua sustentabilidade.

O setor atende 48,8 milhões de pessoas, 25% da população. Reflexo da alta do desemprego, a maior queda de usuários atinge planos empresariais –887 mil a menos.

Um dos sintomas da crise foi sentido em 2015, quando a Unimed Paulistana, sem condições para cumprir seus contratos, foi obrigada pela ANS a entregar a carteira de 744 mil clientes a outros gestores.

A questão é complexa. Em geral, a inflação da saúde é acima da inflação geral por fatores como a incorporação de novas e caras tecnologias, mas, no Brasil, ela tem assumido taxas muito altas também por falhas do mercado.

Entre as discrepâncias estão a ausência de indicadores de qualidade, um modelo de pagamento que incentiva o desperdício e a falta de transparência nos preços. Os dados constam em estudo recente do Insper, feito a pedido do IESS (Instituto de Estudos da Saúde Suplementar), que traça um diagnóstico do setor e propostas para corrigir as falhas.

INDICADORES

Para Luiz Augusto Carneiro, superintendente do IESS, é prioritário definir um conjunto de indicadores de qualidade para o mercado.

“Isso permitirá saber os padrões que queremos atingir, o que a sociedade deseja e o quanto vai custar e até redesenhar produtos para diferentes perfis e coberturas.”

A partir desses indicadores, a proposta é mudar a forma como os planos remuneram hoje os prestadores de serviços (hospitais, por exemplo). “É justo premiar a eficiência e a qualidade e punir a ineficiência. O Brasil está 30 anos atrasado nisso”, diz.

A falta de indicadores de qualidade também afeta os usuários. Nos EUA, por exemplo, é possível escolher um hospital por critérios bem objetivos, como a taxa de infecção hospitalar. No Brasil, esses dados não são públicos. Para Carneiro, o governo federal, via Ministério da Saúde, terá de se envolver nessa questão e precisará ser o indutor da mudança.

Segundo Paulo Furquim, professor do Insper e coordenador do estudo, há evidências de desperdício de recursos, abusos e excesso de procedimentos desnecessários. Hoje vigora a “conta aberta” (fee for service), em que o serviço ganha pela quantidade de procedimentos feitos.

Entre as propostas, há uma que prevê pagar ao hospital um valor fechado para cirurgias, e não por cada item usado (como anestesia, instrumentos e materiais cirúrgicos) como ocorre hoje. “Isso levará o hospital e a equipe médica a considerarem os custos de suas decisões”, diz.

Para Francisco Balestrin, presidente da Anahp (associação dos hospitais privados), além da remuneração, é preciso investir em um novo modelo assistencial, que priorize a saúde, não a doença. “Isso vale tanto para o setor privado quanto para o SUS, já que o modelo de remuneração é o mesmo.”

Outro entrave do setor é a falta de informações sobre os valores de materiais em saúde, o que dificulta a comparação de preços e da qualidade desses produtos -junto aos medicamentos, eles representam cerca de 50% do gasto com internações.

Por exemplo, uma mesma prótese de quadril pode custar entre R$ 2.282 e R$ 19 mil. Ou o preço de um stent farmacológico da mesma marca pode variar entre R$ 7.500 a R$ 29 mil. Nesses preços, entram de tudo, inclusive taxas cobradas pelos hospitais e propinas dadas a médicos.

“Isso distorce decisões e resulta em desperdícios, aumento de custos e riscos ao paciente”, diz Furquim. Uma das propostas é que o governo padronize o preço desses materiais (estipule um valor máximo, por exemplo).

A crescente judicialização do setor é outra preocupação, segundo Solange Mendes, presidente da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar). “Ela desconsidera contratos e regulação.”

FALHAS E PROPOSTAS DA REDE PARTICULAR

REMUNERAÇÃO DOS HOSPITAIS

Como é hoje: Hospitais ganham pela quantidade de procedimentos que executam, o que muitas vezes faz com que eles realizem intervenções desnecessárias para receber mais das seguradoras

Proposta: Adotar remuneração fixa por tipo de procedimento, o que levará o hospital e a equipe médica a considerarem os custos financeiros envolvidos em suas decisões

TRANSPARÊNCIA

Como é hoje: Médicos e hospitais recebem “comissões” de empresas pela escolha de certos procedimentos e materiais. Isso distorce as decisões e provoca aumento de custos e risco ao paciente

Proposta: Processar médicos e hospitais que são pagos pela indicação de materiais, responsabilizar empresas que adotam tal prática e fixar preço máximo de revenda

COPARTICIPAÇÃO

Como é hoje: Beneficiário paga uma mensalidade do plano independentemente da utilização ou não dos serviços. Esse “cheque em branco” o faz usar mais os serviços sem necessidade

Proposta: Incentivar a coparticipação, em que o paciente paga, além da mensalidade, um valor a cada consulta ou procedimento. Os preços ainda precisam ser estudados

INDICADORES DE QUALIDADE

Como é hoje: A ausência de informações sobre a qualidade dos hospitais, laboratórios e médicos da rede faz com que esses prestadores de serviço deixem de investir em melhorias

Proposta: Sistematizar e divulgar indicadores de qualidade sobre a rede credenciada, o que pode estimular a concorrência entre os serviços e a busca por mais eficiência

PROTOCOLOS MÉDICOS

Como é hoje: Médico está no comando das decisões do atendimento, da realização de exames e prescrição de medicamentos e da escolha de procedimentos ou materiais

Proposta: Limitar o poder individual do médico e priorizar o uso de protocolos clínicos baseados em evidências; incentivar programas de segunda opinião, em que outro especialista confirma o primeiro diagnóstico

JUDICIALIZAÇÃO

Como é hoje: Em favor dos usuários, juízes autorizam procedimentos que muitas vezes não constam nos protocolos da ANS ou medicamentos cuja análise de custo/eficácia não seja favorável

Proposta: Elaborar orientação aos magistrados junto ao CNJ; avaliar implantação em SP de câmara de conciliação (que media ações contra seguradoras) para que seja ampliada no Brasil

Compartilhar:

Facebook
Twitter
LinkedIn
Email

Deixe um comentário

Você pode optar por ficar anônimo, usar um apelido ou se identificar. Participe! Seus comentários poderão ser importantes para outros participantes interessados no mesmo tema. Todos os comentários serão bem-vindos, mas reservamo-nos o direito de excluir eventuais mensagens com linguagem inadequada ou ofensiva, caluniosa, bem como conteúdo meramente comercial. Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

JORNALISTA

Emmanuel Ramos de Castro
Amante da literatura, poesia, arte, música, filosofia, política, mitologia, filologia, astronomia e espiritualidade.

Categorias

Veja Também:

Fale com o Blog!