A responsabilidade civil pela perda de uma chance

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“… a intenção não é apenas recompor o patrimônio lesado, mas também atuar de forma educativa para desestimular o ofensor em sua conduta transgressora para outros casos”.


Estamos muito acostumados a ver por aí casos em que a indenização decorre da prática de danos materiais, que se consubstanciam em: 1) danos emergentes, quando há a perda efetiva ou; 2) lucros cessantes, quando o dano se propagará no futuro, como decorrência do fato tido por ilícito.

A título de exemplo, se alguém bate no carro de um taxista, isso gera um dano material emergente consistente na despesa para o reparo do veículo. O tempo que o taxista ficou sem trabalhar enquanto aguardava o reparo do carro é o lucro cessante.

Também é comum falarmos em danos morais, modalidade até deturpada em certo ponto, que acontece quando a ofensa se propaga de forma imaterial, atingindo bens não táteis, como a honra, por exemplo. Existe também a utilização do dano moral, no direito brasileiro, como forma de punição do ofensor, seguindo a doutrina do punitive damage norte americano.

Nessa última modalidade, a intenção não é apenas recompor o patrimônio lesado, mas também atuar de forma educativa para desestimular o ofensor em sua conduta transgressora para outros casos.

Existem também outras formas de dano que a doutrina jurídica expõe, mas, aqui, a nossa intenção é falar sobre a responsabilidade civil pela perda de uma chance.

Para tanto, vamos analisar primeiro os estratos da responsabilidade civil. Ela é sempre motivada por uma ação ou omissão que gere dano, devendo existir um elemento de conexão entre esses dois fatos, chamado de nexo causal.

Se a responsabilidade for de natureza subjetiva, deverá ainda haver o elemento culpa em sentido amplo, podendo ser o dolo (vontade ou aceitação do risco de praticar o dano), a negligência (atuação em desacordo com parâmetros objetivos), a imprudência (atuação descompromissada com parâmetros objetivos) ou a imperícia (culpa do profissional de cada área respectiva).

Nota-se que o campo da responsabilidade civil, pelo menos na parte essencialmente teórica, não é particularmente complexa. A parte difícil está na prática e na aplicação desses conceitos.

Para falarmos, agora, da responsabilidade civil pela perda da chance, mantemos esses elementos, mas observando que, nesse caso, o dano é por algo que poderia ou não vir a ocorrer.

Quando os tribunais analisam esse tipo de questão, é sempre exposto um fato que gerou uma decorrência danosa, mas que poderia ter sido diminuída, e não totalmente excluída, caso algum outro fato tivesse sido praticado.

Note-se, então, que na discussão pela perda de uma chance não se discute que no caso da atuação da pessoa isso acarretaria em inexistência do dano, mas tão somente em maior probabilidade, ou mesmo uma mínima chance de que o dano não viesse a ocorrer.

Isso tem desdobramentos interessantes, mas cuja delimitação em âmbito geral é praticamente impossível, devendo se analisar o caso concreto, pois se se levar a ferro e fogo essa perspectiva, qualquer mínimo lampejo de falsa esperança poderia desencadear processos fundados na responsabilidade civil pela perda de uma chance.

Existem ainda no plano jurídico alguns outros elementos que podem impactar diretamente nesta análise: trata-se da diferenciação entre obrigação de meio e obrigação de resultado.

A obrigação de meio é aquela em que o prestador deve empregar as melhores técnicas e a melhor perícia para a realização dos préstimos, ainda que não ocorra o resultado desejado. Como exemplo, temos a atuação dos médicos e advogados.

A obrigação de resultado é aquela em que o prestador deve garantir o resultado, sob pena de inadimplência. Exemplo desse tipo de obrigação é o contrato de transporte, pelo qual as pessoas ou coisas devem chegar ao destino contratado, não importa o que aconteça. No plano médico, a cirurgia plástica possui algumas práticas que se realizam sob as obrigações de resultado.

Por outro lado, um médico de outra área que aplique uma medicação proibida em um paciente ou o use como cobaia sem que esse saiba, ainda que o cure, ou seja, ainda que tenha chegado ao resultado esperado, estará inadimplente em relação à obrigação de meio, essência de seu dever, cabendo a responsabilização civil e indenização.

Isso gera ainda mais embaraços na questão da análise da responsabilidade civil pela perda de uma chance, pois teria que se analisar, por exemplo, se um advogado, ao omitir um argumento, poderia ser responsabilizado pela perda do processo ou, melhor dizendo, pela supressão de chances de êxito em um processo. A linha é muito tênue e, por vezes, subjetiva.

Outro tema interessante é o fato de que as indenizações são, por essência, uma recomposição patrimonial. Perceba-se: recomposição, significando que a indenização não confere nada de novo à pessoa, mas apenas restaura o que ela antes já possuía, na exata medida do que já possuía. Na responsabilidade civil pela perda de uma chance, essa estimativa fica ainda mais difícil.

No próximo artigo analisaremos um caso concreto para dar uma dimensão um pouco melhor do problema.

Nota: Publicamos neste domingo, excepcionalmente, a coluna do Dr. Bruno Barch Muniz, que escreve, regularmente, às sextas-feiras.

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Emmanuel Ramos de Castro
Amante da literatura, poesia, arte, música, filosofia, política, mitologia, filologia, astronomia e espiritualidade.

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