Em quase um ano e meio de governo, afloraram divergências entre a presidente Dilma Rousseff e seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva. Os dois têm pontos de vista diferentes sobre muitos assuntos. E falam disso quando se reúnem.
É fato, por exemplo, que tiveram opiniões díspares sobre a conveniência de criar a CPI do Cachoeira. Discordaram sobre trocas no ministério e na Petrobrás. Vez ou outra, surgiram ruídos. Enfim, são pessoas e estilos diferentes.
Dilma não é uma marionete alojada no Palácio do Planalto. Nem ele é um caudilho com pretensão de manipulá-la. É possível um rompimento? Resposta: impossível.
A principal razão é o sólido laço pessoal entre os dois. Há afeto de verdade na relação. Para o bem e para o mal, Lula é o político brasileiro que mais faz política com emoção. No seu governo, muitos auxiliares o aconselharam a não dar a mão a algumas figuras que minavam sua imagem. Na maioria das vezes, ele ignorou esses alertas, a fim de priorizar uma blindagem política no Congresso após o susto do mensalão. Lula pagou e paga até hoje o preço disso.
E foi com alta dose de emoção que Lula governou, forçando sua equipe a adotar medidas que aceleraram a redução da pobreza no Brasil. No poder, ele nunca esqueceu sua origem pobre. Quem acompanhou Lula em viagens pelo país testemunhou a intensidade emocional do seu contato com as pessoas, principalmente as mais simples. A alta popularidade do petista é reflexo dessa relação carinhosa com o povo.
A amizade de Lula e Dilma se consolidou em anos de proximidade cotidiana. Ela foi a ministra da Casa Civil que deu a ele o controle efetivo do seu governo. Ele foi o presidente que propiciou a ela a oportunidade de realizar um sonho que parecia inalcançável.
Lula e Dilma gostam um do outro como nunca se gostaram Fernando Henrique Cardoso e Itamar Franco, Paulo Maluf e Celso Pitta e Orestes Quércia e Luiz Antonio Fleury Filho, para ficar nos casos clássicos de rompimento entre criador e criatura da nossa história recente.
O poder real de Lula fora da Presidência é outra razão para crer na impossibilidade de ruptura. Ele não precisa do cargo para ser importante. Lula é. Basta ver a romaria de políticos de todos os partidos e de empresários de todos cantos do país ao Hospital Sírio-Libanês e ao Instituto Cidadania.
A força de Lula faz sombra a Dilma? Faz.
Mas também dá a ela um escudo político invejável. Grande parte da popularidade da presidente é herança do antecessor. Com um estilo próprio, ela tem caído nas graças de setores conservadores que não gostam dele. Juntos e leais um ao outro, Lula e Dilma são imbatíveis hoje na política brasileira.
Apostar numa ruptura é uma furada tão grande quanto aquela do terceiro mandato lulista.
Em 2014, Dilma será a candidata do PT com apoio enfático de Lula. Só um acontecimento extraordinário mudaria isso. Nada no horizonte parece indicar algo nesse sentido. Pelo contrário.
Kennedy Alencar escreve na Folha.com às sextas, às 8h55 de terças e quintas. Na RedeTV!, apresenta o “É Notícia”, programa dominical de entrevista, e o “Tema Quente”, atração diária com debate sobre assuntos da atualidade.