Ele montou uma Corretora, faliu mas não desistiu; quem é ele?

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Depois de modificar a gestão empresarial no País, ele agora quer que um de seus bolsistas seja eleito presidente do Brasil e ajude a difundir a cultura empresarial de seus negócios para a gestão pública


Da IstoÉ Dinheiro

.Na semana passada, no dia primeiro de agosto, em uma de suas raras aparições públicas, Jorge Paulo Lemann, o homem mais rico do País, com uma fortuna estimada em US$ 32,5 bilhões, falou a uma plateia de 800 pessoas no evento de comemoração de 25 anos da Fundação Estudar, que concede bolsas de graduação e pós-graduação a estudantes, no Brasil e no exterior.

Lemann, ao lado de seus sócios Marcel Telles e Beto Sicupira, fundou na década de 1970 o mítico Banco Garantia. Entre seus negócios, destacam-se a sociedade na InBev, além de Lojas Americanas, o e-commerce Submarino, as redes de fast food Burger King e Tim Hortons, o 3G Capital e a Heinz Kraft.

Conhecido por seu estilo de gestão focado em resultados, o bilionário defende a meritocracia, o pragmatismo, a seleção criteriosa dos integrantes do seu time, que influenciou o modelo de gestão empresarial do país. Agora ele quer, por meio dos estudantes de sua fundação, levar esses conceitos para a gestão pública. Confira, a seguir, os principais pontos do bate papo entre Renan Ferreirinha, bolsista da Fundação Estudar no curso de Economia e Ciências Políticas de Harvard, nos Estados Unidos, a quem Lemann apresentou como “uma das esperanças para o Brasil” e que já manifestou interesse na carreira política quando ele se formar e voltar ao Brasil, em 2018.
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Renan Ferreirinha – Se o sr. tivesse que dizer qual foi seu primeiro sonho grande, qual seria?

Jorge Paulo Lemann – Aos nove anos de idade eu ganhei um torneio de tênis e fui entrevistado. Me perguntaram o que eu queria ser e eu respondi que queria ser o campeão mundial em tênis. Nunca fui o melhor tenista do mundo, mas aos 40 anos e aos 50 anos ganhei o título mundial dos veteranos. Não fui bem o melhor, mas dei uma enrolada e arrumei outro título parecido. Sempre fui competitivo, sou competitivo. Quero ser o melhor, fazer o melhor. É da minha natureza isso.

R – Quem te inspirou a não se contentar com pouco?

JPL -Eu perdi meu pai quando tinha 13 anos. A minha mãe era uma pessoa muito influente e próxima a mim. Ela me deu muito amor e liberdade. Fui criado num ambiente em que eu podia fazer tudo e ela me apoiava. Isso foi uma grande influência na minha vida. Aos 13, 14 anos eu viajava com amigos para Cabo Frio (RJ) para pescar e jogar campeonatos de tênis e tinha que me virar. Minha mãe sempre me dava apoio, mas sempre me dizia para tentar mais, para melhorar. Acho que ela foi minha primeira grande inspiração. Depois eu tentei copiar as pessoas legais que eu via no exterior tendo sucesso. Durante uma época eu tive bastante acesso às pessoas do Goldman Sachs, que era o melhor banco de investimentos do mundo naquela época, e que tinha um sistema muito interessante de partnership. Copiei muito o estilo do Jack Welch na General Electric (GE). Ultimamente tenho tido muito contato com o Warren Buffett que, sem dúvida, é uma pessoa muito inspiradora e tem muito a ensinar. Tenho aprendido muito com ele. Estou sempre tentando aprender. Ler eu gostaria de ler muito mais, mas quase não sobra tempo, e leio algo aqui e ali.

R– Os dez primeiros anos da sua carreira foram um momento de grande reflexão. O sr. poderia nos contar sobre esse processo de reflexão de como poderia começar seu sonho grande?

JPL – Parece até que eu tinha muito tempo para ficar pensando. Era mais ter que me virar para continuar sobrevivendo e andar para frente. Aos 26 anos eu tinha me juntado a um pessoal de Harvard para montar uma corretora e nós falimos. Eu estava falido e precisava resolver o que fazer e não havia muito tempo para reflexão. Optei por ficar no mercado de capitais, porque achava que era onde tinha a melhor oportunidade. Mas não foram anos de grande sucesso. Primeiro me juntei a uma corretora, que não deu errado, mas também não deu muito certo. Só em 1971 que eu consegui fundar o que viria a ser o Banco Garantia, era uma corretora naquela época, e aí engrenou. Mas entre 1961 e 1971, a minha mãe ficou muito aflita porque tinha grande esperança de que eu iria fazer alguma coisa significativa, mas na verdade não fiz muita coisa porque fiquei pulando de galho em galho, tentando sobreviver. Para aqueles que estão pulando de galho em galho, isso acontece, mas dá para chegar lá.

R – O sr. teve algum sonho que não conseguiu realizar e teve que seguir em frente?

JPL -Acho que sempre tem alguma coisa. Quando você tem um sonho grande, você vai naquela direção, mas às vezes não dá e você tem que andar para trás. Eu trabalhei no Banco Garantia por 27 anos. Minha ideia era de que o banco fosse permanente. Acho que a prova de um empreendedor, se ele é bom ou não, não é quanto dinheiro ele está ganhando naquele momento, mas se o negócio que ele montou vai sobreviver nos próximos 30, 50 anos. A minha ideia era de que o Banco Garantia teria uma longa duração, mas por uma série de circunstâncias – essa é uma história longa, não vou contar aqui -, o banco acabou. Serviu como um grande aprendizado, deixou um legado de algumas coisas boas, mas podia ter sido muito melhor, né? Por outro lado, um sonho grande que não aconteceu não deixa de ser um aprendizado, eu pude corrigir o rumo nas coisas que estou tentando fazer agora.

R– O que levou o sr. a escolher seus sócios e existe uma fórmula para achar os sócios perfeitos?

JPL– Todo nosso processo de seleção não é milagroso e nem acontece de um dia para outro. No Banco Garantia sempre aparecia uma porção de gênios que queria trabalhar lá, mas que logo de cara queriam 10% do capital. Eu nunca aceitei isso porque achava que eles tinham que vir trabalhar, depois virariam sócios pequenos e essa fatia iria aumentando, então sempre foi um processo gradualista, meio darwniano. A escolha dos melhores, mas aos poucos. Nunca gostei de sociedades repentinas. Talvez a única que fizemos realmente foi com os belgas [InterBrew], quando tínhamos as cervejarias na América do Sul, e resolvemos nos unir a eles em condições de igualdade e paridade de voto e condições. Essa foi a sociedade em que não houve tempo para estudar muito. Pulamos um pouco no escuro. No caso dos belgas a nossa situação era a seguinte: ou éramos um sapo grande num poço pequeno, que era o mercado brasileiro, ou tentar ser um sapo grande no mercado mundial. Então valia a pena o risco e tomamos o risco. Todas as outras foram graduais. O Beto (Sicupira), o Marcel (Telles) foram se tornando sócios aos poucos, o Claudio Hadad também. Em linhas gerais, eu acho que sociedade é algo para ser cultivado aos poucos, como um casamento, namorando, testando, até decidir virar sócio.

R– O sr. falou da grande influência da sua mãe.Como pai, como tentar incentivar seus filhos?

JPL -A minha família tinha um certo patrimônio, mas não tinha muita liquidez. Então, eu venho de uma família suíça, pão dura por natureza. Nós poupávamos bastante e dávamos valor a ter dinheiro. E eu acho que isso, na realidade, torna mais fácil a educação dos filhos. Meus filhos são todos ótimos, mas a verdade é que foram criados em outras circunstâncias. O negócio de o meu pai gritar ‘apague a luz, você acha que sou sócio da Light?’ lá em casa não existe muito. Não que eu não grite isso, mas eles dão menos bola. Eu acho mais fácil você criar crianças num regime de pouco dinheiro do que onde há mais dinheiro disponível. Eu acredito que as pessoas têm que fazer o que elas gostam. A única maneira de fazer uma coisa bem é gostando muito. Então, meus filhos podem fazer o que quiserem, estou ali para ajudar, mas eles é que têm que encontrar o que gostam de fazer. Vão ter ajuda, mas têm que se provar, como todo mundo que entrou na nossa sociedade. Há um sistema de meritocracia em casa também.

R– O sr. ainda tem algum sonho grande?

JPL – Sempre tem um sonho grande, não sei viver sem um sonho grande. Diria que meus sonhos grandes iniciais eram mais ligados à minha pessoa, queria ser campeão de tênis, queria pegar as melhores ondas, fazer a melhor corretora. Hoje em dia, esse negócio de ser o melhor ainda me interessa, mas ser o maior traz certo desconforto. Ser o maior não está muito popular no mundo não. Até nos Estados Unidos eu vejo um candidato como o Bernie Sanders, com a popularidade e ressonância que ele tem, ele é contra tudo o que é grande. Então tive que modificar um pouco os planos de ser o melhor e o maior, para ser o melhor – o maior um pouco menos, tem que espalhar o sonho um pouco mais e envolver mais gente. A Fundação Estudar, a Fundação Lemann e melhorar a educação do Brasil são sonhos grandes que eu tenho ainda. Eu gostaria de ver um país mais igual, em que todo mundo tivesse a oportunidade de estudar e de chegar lá, de ter a mesma oportunidade. Meu sonho grande, que pretendo realizar e concretizar nos próximos anos, é o Brasil, é de vocês jovens virem para o Brasil, melhorarem o Brasil. O que foi feito na Brahma, na AmBev, nos nossos negócios, pode ser feito no Brasil. A minha turma quando começou, o que tinha para melhorar era a parte empresarial. O governo era militar e não havia espaço para você entrar no governo. Eu acho que você vai ter uma bela oportunidade para gente jovem, para vocês voltarem e fazerem parte da política no Brasil, da governança do Brasil. E espero que aí reproduzam os nossos conceitos de meritocracia, pragmatismo, resultado, oportunidade para todos, empreendedorismo e essas coisas todas que eu acredito. Tem muito espaço para melhorar as coisas no Brasil. Eu vejo tanta falta de bom senso. Uma administração um pouco mais pragmática, com um pouco mais de bom senso, que poderia melhorar o Brasil enormemente. Essa é a minha grande esperança.

R – O sr. fala muito em tentarmos ser mais pragmáticos, em deixarmos de lado as diferenças que contribuem para o debate de lado, e focar mais em executar. Como o sr. vê essa sinergia entre sonhar grande e executar bem e como conseguiu fazer isso em sua trajetória?

JPL– Eu acho que eu sou melhor sonhador do que executor. Sobre executar, eu corro atrás, sei e acompanho o que é importante, mas tive a sorte nas nossas sociedades de encontrar o Marcel, o Beto, o Cláudio que são melhores executores do que eu. Eu estive na semana passada com o Eike [Batista], o Eike é um baita sonhador, um empreendedor, que está aí de novo já pensando em dez mil projetos, que vai ganhar bilhões, um espetáculo em termos de empreender, mas que não teve a sorte, que não escolheu bem as pessoas para acompanhar isso. Eu sou mais sonhador do que executor, mas sou o primeiro a reconhecer que ficar pensando grande não adianta nada. Tem que executar bem, sem isso não adianta sonhar grande. Eu estive recentemente na Califórnia com Elan Musk, da Tesla e do Space X, talvez o maior sonhador da atualidade. Ele é um malucão. Eu almocei com ele, num sábado e, às 14h, ele me pediu desculpas e disse que tinha que voltar para a fábrica porque estava tendo problemas com a produção do Tesla e queria ter certeza de que eles iriam cumprir as cotas de produção do dia. E disse que se nada funcionasse, que ele iria dormir lá. É um cara de grandes realizações.

R – Se pudesse voltar alguns anos, o que o sr. faria de diferente?

JPL – Eu demorei um pouco para ter uma visão de longo prazo das coisas. Era uma carioca, surfista, tenista e dono de uma corretora – em corretora você pensa nas próximas 24 horas. Em banco de investimento também, é um negócio de oportunidades, de momento. Demorou um tempo para eu realizar que aquela atividade toda, aquele turbilhão, é divertido no dia a dia, mas a realidade é que se você não pensar mais em longo prazo e para onde vai em longo prazo, e incutir isso na cultura das pessoas que trabalham com você, você não vai chegar muito longe. Gostaria de ter aprendido antes sobre ter uma visão mais de longo prazo e estar disposto a investir em longo prazo, com as pessoas dispostas a percorrer o longo prazo. Nossa cultura de corretora, ou de banco de investimento, não era a de agradar ao cliente. Com o passar dos anos eu aprendi que se você quiser mudar uma coisa maior não há a possibilidade de fazer isso sem agradar às pessoas que estão comprando o seu produto, a quem você está servindo. Se eu tivesse aprendido isso um pouco antes, poderia ter feito mais.

R – Há 25 anos, o sr. poderia imaginar a fundação como ela é hoje?

JPL – Não. A primeira ideia era ajudar a alguns indivíduos. Depois, além dos poucos bolsistas a quem concedemos bolsas, a tentar transmitir valores e ensinamentos para mais gente. O mundo mudou também – hoje em dia você tem acesso ao mundo na internet – e a fundação mudou e tem mais acesso a pessoas do que eu imaginaria. Meu objetivo para a fundação sempre foi institucionalizá-la, para que ela sobrevivesse ao Beto, ao Marcelo e a mim. Há alguns anos nós estamos um pouco afastados do dia a dia da fundação, porque escolhemos gente boa para tocá-la e fico surpreso com os resultados que esse time alcança, muito maior do que eu poderia imaginar. Eu acho isso bom. Por outro lado, acho que dá para melhorar muito.

R – Tem algum exemplo prático do que a Fundação pode fazer para melhorar em termos de atingir todos os jovens de alto impacto do Brasil?

JPL– Não é segredo nenhum que eu espero que a fundação tenha um presidente do Brasil em algum momento. Meu sonho grande é que o presidente do Brasil chame um bando de bolsistas para ir para lá e consertar o País. Espero que a Fundação transmita todos esses nossos valores – ética, pragmatismo, meritocracia, que eu acho que fazem falta no Brasil e espalhe isso para melhorar o País. Esse é meu sonho grande para a Fundação.

R – O sr. sempre diz que crise é uma oportunidade de mudança…Qual o conselho que o sr. dá aos jovens, aos novos bolsistas que estão aqui?

JPL – Acho que vai ter uma oportunidade maravilhosa para gente jovem. Eu passei a minha vida toda fugindo de política, não querendo nem chegar perto. Hoje eu acho isso errado. Para os jovens que estão aí e têm vocação para a política, agarrem a oportunidade de ingressar na política, de ser influente. Eu e meus sócios estamos fazendo tudo o que é possível no setor empresarial, demonstrando boas práticas, que o resto do mercado copia. Agora se algum de vocês ingressarem na política com esses valores, isso é que vai fazer a diferença para o Brasil e eu espero que isso aconteça.

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Emmanuel Ramos de Castro
Amante da literatura, poesia, arte, música, filosofia, política, mitologia, filologia, astronomia e espiritualidade.

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